quarta-feira, 30 de março de 2016

Até quando você vai amamentar?

Por Fernanda Rezende Silva


Imagine que você é uma mãe que tem um bebê de quase 2 anos e amamenta. Você enfrentou as dificuldades iniciais da amamentação, resistiu bravamente a mamadeiras e chupetas, conseguiu amamentar exclusivamente por 6 meses, tinha sempre uma resposta na ponta da língua para pitacos do tipo “seu leite é fraco”, “nessa idade o leite virou água”, “ele precisa desgrudar de você”.
Você já faz parte de uma minoria que conseguiu vencer tantas batalhas (meus parabéns!) mas calma, não acabou – você ainda tem pelo menos mais uma pela frente: as pessoas que pensam que a amamentação precisa ter um prazo de validade estabelecido pela mãe.
Muitas pessoas pensam que a mãe precisa estabelecer esse prazo porque senão “o bebê não vai parar de mamar nunca”. Esse mito é fácil de desmentir: não existe nenhuma pessoa no mundo que tenha mamado até a idade adulta, então, quando ouvimos esse argumento, na verdade a pessoa quer dizer o seguinte: “não vai parar de mamar num prazo razoável”.
E o que é um prazo razoável?
Mamar até 4 anos, por exemplo, é “feio”? Não deveria ser visto como “feio” se tivéssemos uma cultura de amamentação – infelizmente as coisas por aqui andam invertidas, ao ponto de acharmos bonitinho uma criança de 2 anos tomando mamadeira e acharmos esquisito uma criança da mesma idade sendo amamentada. Eu não pretendo oferecer outro leite para a minha filha, então o meu primeiro argumento a favor da amamentação prolongada é este: vou amamentar até quando ela precisar, e se uma criança da mesma idade tem direto a uma mamadeira ou chupeta então ela tem direito de ser amamentada – em qualquer lugar e a qualquer hora.
Existem motivos físicos e psicológicos pelos quais o tempo da criança deve ser respeitado, ou seja, o ideal é o desmame natural. Vamos começar falando das razões físicas, que sempre (infelizmente) são colocadas à frente das razões emocionais.
O leite materno contém nutrientes, água, anticorpos – então, para que o bebê possa dar tchau para o leitinho da mamãe ele deve antes conseguir suprir estas três necessidades de outras formas. É fácil imaginar que se o bebê já se alimenta bem então ele vai obter os nutrientes dos alimentos.
Ok, mas nem todo bebê se alimenta sempre bem – existem períodos críticos em que até os comilões não querem saber de comida e só querem mamar, mamar e mamar.
Um exemplo desses períodos é o nascimento dos dentes, e por essa razão penso que é maluquice desmamar um bebê que ainda não completou a dentição – ele terá períodos em que não vai comer direito, e aí o que resta fazer? Dar leite de vaca? Seria muito mais fácil e melhor para o bebê se ainda pudesse contar com o Leite Materno.
Leite materno contém água – muita água – logo o bebê só poderia ser desmamado depois que já estiver conseguindo se hidratar plenamente, sem depender do Leite Materno.
Em um desmame abrupto é comum o bebê sofrer constipação, por exemplo, pois ele não conseguiu ainda trocar todo o Leite Materno por água – seria muito melhor aguardar a transição gradual, concorda?
E sobre os anticorpos: é fato que bebê amamentado adoece menos, pois os anticorpos estão presentes no leite materno. Quando seria então o melhor momento para não depender dos anticorpos do Leite Materno?
Quando o sistema imunológico do bebê estiver pronto. Já li algo sobre o sistema imunológico finalizar a sua formação por volta dos 2 anos, mas também já ouvi de alguns médicos que esse prazo pode se estender até os 4 anos – na dúvida eu não quero arriscar, prefiro que minha filha dê sinais de que está pronta para o desmame.
Vamos resumir então os motivos físicos: como saber se o Leite Materno já foi substituído por água e alimentos e o sistema imunológico não precisa mais dele?
Quando o bebê der sinais de que está pronto para ser desmamado. É claro que a mãe pode conduzir o desmame, dar um pontapé inicial, mas sempre observando a criança e conduzindo este desmame de forma gradual.
E os motivos psicológicos, onde entram nessa história? Para entender essa parte a mãe precisa ter a habilidade de se colocar no lugar da criança. O peito é o porto seguro desse bebê desde que nasceu – não será de uma hora para outra que isso vai mudar. Por mais que essa mãe tenha a intenção de substituir a amamentação por outras formas de vínculo, nem sempre o bebê vai entender o recado – o entendimento da criança é limitado, é muito difícil entender que num dia tem “mamá” e no outro não.
Se um bebê é desmamado de forma abrupta e ele não está preparado para isso ele vive um verdadeiro luto – é um sofrimento imenso, o bebê não precisa passar por isso. Já li relatos de bebês que choraram por 21 dias em desmames abruptos – nesse prazo o ser humano se acostuma até com a morte, não há como negar que esse bebê sofreu demais e corre um sério risco de levar esse trauma para a vida adulta.
Você já perguntou para uma mãe que dia o filho dela vai começar a andar? Imagino que não, pois seria uma pergunta absurda. Alguns bebês andam com 8 meses – outros só começam a caminhar com 18 meses – e em ambos os casos os bebês são normais, apenas têm desenvolvimentos diferentes.
Com o desmame é a mesma coisa: alguns vão desmamar com 2 anos, outros com 4 anos ou mais… Não há nada de errado nessas variações, e o desmame deveria ser visto como uma etapa do desenvolvimento do bebê, assim como o engatinhar, o caminhar, etc.
Depois de todos os argumentos acima, acho que você já entendeu que amamentação não tem prazo de validade, e que cada bebê tem seu tempo, certo? Pois então, segue uma dica: não pergunte NUNCA para uma mãe até quando ela vai amamentar, não pague esse mico. Mãe e bebê têm direito de prosseguir a amamentação até quando quiserem, é um direito deles, e se a nossa sociedade ainda não entende isso então o problema não está nessa mãe nem no bebê – é a nossa cultura de falta de apoio à amamentação que precisa mudar.

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